Uma saudade sem fim, que é agravada pela impunidade e falta
de respostas, perder um ente querido é muito doloroso, seja de morte natural ou
acidentes e desastres, como Brumadinho. A conta matemática da dor pode ser de multiplicar,
por mil, quando o parente morre assassinado, some-se a dor o agravante de morte
hedionda, brutal e perversa. O resultado desta conta macabra é um vazio no
coração e uma dor latente, que não há remédio que amenize, a não ser a morfina
da prisão dos culpados por tais atos.
Em Riachão do Jacuípe, dois casos brutais chamaram atenção
da imprensa e do mundo em situações distintas, dois assassinatos com requintes
de crueldade que até hoje a policia não desvendou quem cometeu, até hoje,
familiares, amigos e a população aguarda uma resposta, um culpado, mas nada aparece.
Se fosse uma novela diria que se assemelha ao mistério de “Quem
matou Odete Roitman?”, personagem icônico da novela Vale Tudo da década de 1980,
que está sendo reprisada pelo canal Viva nas tvs por assinatura, e que está em
seus capítulos finais. Para quem é noveleiro, sabe que na época essa pergunta
parou o Brasil, e quem acompanhava a trama, via um delegado e uma equipe de
investigação, havida por respostas, no encalço dos suspeitos, em busca do algoz
que ceifou a vida da empresaria, que no final se descobre a assassina ser uma
mulher enfurecida pelo ciúme que atira pensando estar matando outra pessoa.
Mas a vida real é bem diferente, em Riachão a pergunta
permanece no ar, quem matou a professora Ienata Rios? Quem matou Marlon da
Chapada? Será que se fosse novela das 9hs teríamos já uma resposta dos vilões da
trama que cometeram tais atos brutais?
CASO IENATA
O ano era 2016, em sua casa, depois de uma noite de sono,
mesa posta, detalhe, para dois, alegre e feliz, despertara a professorinha, sem
saber que momentos depois dormiria para sempre numa poça do seu próprio sague. Apenas
teve tempo de cozinhar um cuscuz, comida preferida de seu noivo, que inclusive
chegou a ser preso, como suspeito do crime, mas hoje vive tranquilamente, em
liberdade, na cidade de Dias D’ávila. 60 facadas, isso mesmo, 60 facadas
tiraram a vida de pró Ienata, a mais querida da escola, a mais querida dos
vizinhos, mulher feliz, de uma rotina alegre, amiga de todos, morta, de forma
brutal.
Na casa, pegadas de sague, mãos ensanguentadas no muro, o
assassino ou assassina, subiu para olhar o movimento da rua, procurando o
momento certo de fugir, e fugiu, e foge até hoje, mas não de sua consciência. Muitos
protestos, mas como diz o ditado, tudo um dia cansa, e os incansáveis lutadores
se renderam perante o silencio da impunidade. Dois anos e 6 meses já se passaram,
e o vazio das respostas pouco a pouco cala a voz da justiça, mas não cala a dor
dos corações dos que amavam a professora, e ainda lembram de seu sorriso. O silencio
da impunidade deixou para traz um portão entreaberto, um corpo estendido no
chão.
CASO MARLON
O ano era 2018, em casa Marlon se prepara para assistir mais
um vídeo no youtube e responder seus seguidores no facebook, passava de meia
noite, o distrito de Chapada, a cerca de 10 km de Riachão do Jacuípe dorme,
está em silencio, como é típico de interior. Calmamente uma caminhonete adentra
o povoado, segue em direção à casa do repórter ventania, famoso por seus vídeos
polêmicos, feitos de forma simples, com celular, indo ao encontro de suas
fontes e entrevistados no seu carrinho simples, já velho e surrado movido a bujão,
característica comum no interior de muitos estados. O repórter ventania sabia falar,
e muito bem, mas não sabia dirigir, contava com ajuda de amigos que dirigiam
pra ele e serviam de cinegrafista, Marlon não tinha formação acadêmica, mas
tinha o dom da comunicação nas veias.
Na rua escura a caminhonete para, alguém permanece ao
volante, sentando em sua escrivaninha está Marlon, distraído, não sente que seus
algozes o espreita, um estampido, um cadeado rompido, ele levanta e grita,
perguntando quem o perturbava, inocente, achou ser algum amigo, fazendo alguma
brincadeira, mas, pela sua sombra, do vitral da porta, recebe a primeira e mortífera
bala, mais disparos se seguem, rompendo o silencio do sono sereno dos moradores
do tão pacato povoado, a voz de ventania era calada para sempre pelas rajadas
mortais de uma arma.
A mãe e o irmão dormiam na casa em frente, Trindade, mãe de Marlon,
tem um nome bem peculiar, quem já ouviu falar da santíssima trindade, saberá o
que digo, mas a santíssima paz do coração desta mãe, nunca mais foi a mesma. “As
vezes ouço os barulhos dos tiros e acordo assustada, parece um pesadelo”, sim,
um pesadelo sem fim, só quem é mãe sabe a dor que é perder um filho, afinal a
ordem natural, mesmo que nós filhos também relute, a ordem natural é filhos
velarem pais, não o inverso.
O caso de Marlon foi falando até fora do pais, cobranças por
punições foram pedidas, mas com a mesma tranquilidade que entrou, a caminhonete
saiu de Chapada, atravessando o silencio da madrugada, o silencio da
impunidade, levando com ela os assassinos de Marlon da Chapada, e levando a
bordo de sua carroceria, a certeza da impunidade na imagem da dama da foice
sentada de carona, seguindo um rumo ignorado, rumos ignorados, fugas ignoradas,
pistas deixadas tão contundentes, mas como a vida é real e não uma novela, até
quando os vilões fora da ficção ficarão do lado de cá, na plateia dessas
historias macabras que seguem como uma novela infinita?
Marlon de Chapada e Ienata Rios, a mancha de sangue, a cicatriz
aberta e incurável, que mancha a justiça e alimenta a impunidade na cidade
outrora calma, tranquila, de senhoras sentadas à porta de casa para tomar a fresca,
mas que hoje se tranca no pavor das 21hs, pois a dama da foice é traiçoeira, e
ronda, rindo da certeza de que pode ter mais uma vida servida de bandeja com o
tempero do silencio da impunidade, do segredo do instrumento que a fez beber de
mais uma alma. Que breve eu possa trazer aqui a noticia de ambos crimes solucionados,
assim como na novela Vale Tudo, que na sexta-feira (8) revelará em seu último
capitulo a verdadeira assassina de Odete Roitman, Leila, mas como na vida real,
acaba impune pelo ato e com o marido dando uma banana para o Brasil, fugindo em
um avião particular para o exterior, qualquer semelhança com a realidade, não
será uma mera coincidência.
POR ALANA ROCHA.